Gravar músicas em casa: como começar

Gravar músicas em casa é um desafio? Você já ouviu falar de Finneas? Aos 22 anos, ele faturou o Grammy 2019 de melhor produtor e melhor engenharia de som pelo disco que criou ao lado da irmã Billie Eilish, que tem 18 anos. Ela levou os prêmios de gravação, canção e álbum do ano, com o “When we all fall asleep, where do we go?”, disco gravado pelos dois em casa. Billie lembra, inclusive, que gravou os vocais desse sucesso “sentada na cama, com as pernas cruzadas”. 

Essa história responde muito do que você procura nesse texto. O que os irmãos Finneas e Billie Eilish têm no home studio, você também pode ter. A diferença é o artista: só ela pode soar daquele jeito. E só você faz a música que é capaz. 

Neste artigo, vamos dar dicas de como gravar em casa. Na medida do possível, claro, porque não conhecemos a sua casa. E este conhecimento é importante que você mesmo(a) tenha, para tirar o melhor do seu trabalho. 

Trate a sala

Primeiramente, não precisa subir muro, derrubar parede e transformar radicalmente o seu imóvel. No entanto, é possível minimizar reflexões e vazamentos de uma sala não tratada, e gastando pouco dinheiro. Claro que não basta colocar caixa de ovo e espuma onde bem entender. Neste outro artigo aqui, explicamos a você como descobrir os locais que você precisa tratar para “secar” o som da sua sala.

Cerque-se dos melhores equipamentos

Neste tópico, o P.S. vem no começo: o melhor não é o maior ou o mais caro. Não adianta um monitor de referência grande em um quarto pequeno, em que as frequências não terão espaço para se difundir, nem para refletir. Assim como não faz diferença uma mesa com dezenas de canais, sendo que você só vai conseguir gravar um ou dois por vez. Lembre-se de que o revolucionário álbum Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, foi gravado em 4 canais. 

Nesse caso, o melhor equipamento é aquele que melhor se adéqua ao seu home studio e ao trabalho que será realizado nele. 

Para saber de quais equipamentos você vai precisar, baixe nosso Checklist do Home Studio, antes de tudo. 

Conheça o processo

Caso você seja como a maioria dos donos de home studio, que começam gravando a própria obra, lembre-se do seguinte: você vai fazer tudo. Acima de tudo, a energia que você canaliza para a interpretação em um estúdio alugado precisa ser dividida ao longo do processo, do desenrolar dos cabos à masterização final. 

Sim, você vai precisar de um quadro com o checklist anotado, para ir completando com um X a cada fase cumprida. 

O trabalho de gravação é composto, basicamente, das seguintes etapas: 

Pré-produção 

  • Estudar referências sonoras para o som que você busca.
  • Elencar os equipamentos que você precisa ter em mãos. 
  • Montar um checklist. 
  • Definir arranjos. 
  • Testar timbres e instrumentos. 
  • Gravar demos.

Produção 

  • Definição das estruturas das faixas.  
  • Escolha de BPMs. 
  • Teste de clicks.
  • Gravação de guias. 

Gravação

Se for gravar a si mesmo, tente deixar tudo à mão para se dedicar à performance. Bem como, caso esteja gravando outro artista, faça com que ele se sinta à vontade. Ele deve se preocupar apenas com a interpretação – o resultado sonoro é responsabilidade sua. Sim, em situações em que você precisar tocar, cantar, gravar, bater escanteio e cabecear, a coisa fica meio o médico e o monstro mesmo. Nada que o tempo e a experiência não facilitem, todavia. 

O registro de instrumentos eletrônicos como baterias e beats sequenciamos é um pouco menos romântico, mas também exige precisão e atenção. 

Pós-produção 

Nesse estágio é possível: 

  • Adicionar instrumentos virtuais em gravações MIDI.
  • Adicionar plugins de efeitos. 

Um desses efeitos, o reverb, deixou de ser um efeito, para ser uma condição de gravações em home studio. Uma vez que sua casa não possui um reverb natural de um estúdio profissional construído para isso, o caminho a se seguir é gravar tudo o mais seco possível. Na pós-produção, você pode adicionar, com carinho e coerência, o level de reverb desejado para criar aquela profundidade no som, dando “liga” à banda. 

Edição

Lado bom: 

Esse é um belo exemplo do que a gravação digital contemporânea possibilita. 

  • Escolha dos melhores takes.
  • Edição do tempo, com o recurso do time-stretching.
  • Corte de trechos que não vão fazer parte da faixa.
  • Mudança de tons. 
  • Redução de ruído: que podem surgir devido a interferências na corrente elétrica, cabos de má qualidade, ou pequenos problemas na conversão analógico/digital – pesquise sobre a relação sinal ruído. Existem dezenas de filtros que contribuem para resolver esses problemas

Lado ruim: 

Mesmo com filtros e plugins de redução de ruído, se a captação for mal feita, não há edição que opere milagres. Ou seja, tentar reduzir saturação ou ruído muito forte pode piorar ainda mais a qualidade do áudio. 

Lado a se refletir: 

O paradoxo. Editar não é corrigir. Portanto, ainda que algumas deficiências de captação e interpretação possam ser consertadas, o ideal é captar a melhor performance possível para que se edite apenas o que for imprescindível. Além de tempo, você ganha em valor artístico. Sim, o famoso “auto tune” pode salvar aquela escorregadinha de leve no vocal, mas não se acomode: qual a perspectiva artística de carreira para um cantor que depende tanto desse recurso? Outro ponto interessante para ser compartilhado sobre a edição: não há nada mais torturante do que arrastar centenas de notas fora do tempo ao longo de toda uma gravação.

Mixagem

Recomendamos que você dê um descanso aos seus ouvidos entre a gravação e a mixagem. Posteriormente, quando voltar às tracks, com a mente arejada, uma nova percepção vai trazer mais ânimo e explicitar outros pontos, antes ocultos. Na mix, você faz: 

  • Balanco dos volumes de cada instrumento.
  • Equalização: tratamento de frequências. É preciso ser feita separadamente em cada instrumento e depois observada no todo. Assim é possível evitar que dois instrumentos ocupem a mesma frequência. Certifique-se de estar bem disposto para realizar essa atividade!
  • Panning: posicionar cada instrumento em um espaço no espectro da imagem-estéreo.
  • Automação: possibilita ajustes específicos em trechos diferentes da canção, como um instrumento que se movimenta ao longo do estéreo durante a música, outro que sobe no volume no momento do solo, etc. 
  • Compressão: também pode ser feito em cada instrumento e depois no todo da faixa dependendo do estilo musical trabalhado. Contribui para nivelamento da presença de cada som na música. 

Masterização

Esse processo demanda um pouco mais de conhecimento técnico e, geralmente, de equipamentos próprios para esse fim. Consiste em deixar o áudio final em um padrão de volume suportável para execução em qualquer dispositivo de áudio. 

Um interessante exercício para você começar é ouvir sua faixa em celulares, som automotivo, alto-falante de notebook, fones in ear, aparelhos domésticos e tudo o que for possível. 

A masterização, da mesma forma, possibilita comprimir e distribuir as frequências separadamente ao longo do estéreo. Normalmente, é um processo terceirizado, mas alguns plugins estão popularizando sua execução em home studios: 

  • Izotope Ozone.
  • IK Multimedia T-Racks 

Além das leituras, hoje temos uma infinitude de vídeos disponíveis na internet para cada tipo de experiência em gravações digitais. Mas se tem uma coisa insubstituível, essa é a prática. Em suma, teste, teste muito. Só testando você vai alcançar o diferencial que apenas seu home studio pode oferecer. Quem sabe seja gravar vocais sentado na cama, como a Billie Eilish.


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Nerau