Acústica para home studio

Certamente, este será mais um de vários posts sobre acústica de home studio que você lerá em sua vida. Para não sermos repetitivos, vamos tentar explorar outra tônica, comparando com alguns artigos que lemos por aí. Lógico, alguns fundamentos precisam ser ratificados para tenhamos certeza de que todo mundo está olhando para a mesma direção: melhor resultado sonoro ou conforto acústico. Vamos tentar contextualizar por meio do mito de Aquiles e seu calcanhar.

Apelando para a mitologia grega de forma bem rasa, Aquiles foi considerado o mais belo e um dos melhores guerreiros de Tróia. A sua história tem por passagem mais famosa a fragilidade de seu calcanhar, parte do corpo que não foi banhada ao ser mergulhado no rio Estige. Justamente, o ponto que seria atingido pela flecha envenenada que causou sua morte.

O que isso tem a ver com acústica para home studio?

Trazendo para o objetivo de nosso estudo, a acústica para home studio, usaremos justamente esse fato: é o calcanhar de Aquiles (o ponto fraco) do ambiente para direcionar o trabalho.

Muitos falam de salas grandes, dimensões em Gold Ratio (proporção entre altura, largura e profundidade otimizadas que uma sala deveria ter), sistemas box in box (construir seu ambiente como uma caixa dentro de uma caixa), simetria de salas, bass traps gigantescos. Tudo isso é, praticamente, uma utopia que quem quer montar um home studio. Pequeno. Simples. Em casa. E, principalmente, barato!

Não me entendam mal. A acústica é gigante e importante! Todo conhecimento sobre ela é sempre válido. Aliás, quanto mais conhecimento de base você tiver, mais simples e baratas serão as soluções encontradas para solucionar o seu problema. Entretanto, para o momento, vamos à versão home da acústica.

Princípios básicos da acústica: o som

Quando entendemos o que de fato é o som, as peças do quebra-cabeças chamado acústica começam a se encaixar mais facilmente. O som é o transporte de energia em forma de vibração da boca de quem fala para o ouvido de quem ouve. De uma corda vocal a um tímpano. Do violão ao microfone.

Nele há intensidade. Sons fortes e sons fracos chegando a um captador (ouvido, microfone, captador eletromagnético, captador piezoelétrico).

Nele há frequência. Sons altos (agudos) e baixos (graves) em um espectro que vai de 20 Hz à 20 KHz que compreende a nossa audição.

Temos transmissão, sons que atravessam portas janelas e paredes. Também, temos reflexão, aquele reverber esquisito em salas pequenas que podem prejudicar muito a qualidade de nossa gravação ou audição do trabalho. Temos absorção, a transformação de som em calor em espumas, lãs e outros tipos de materiais.

Mas vamos tentar ir pelo mais simples…

Isolamento vs. tratamento (condicionamento) acústico

Isolamento é tentar evitar que sons entrem ou saiam do ambiente. No caso do home studio, o cachorro que late na rua não pode estragar a sua gravação. Assim como, se você gostar de gravar às três da manhã, não pode estragar o sono de quem quer dormir sossegadamente.

Tratamento ou condicionamento é garantir resposta de frequência plana (agudos médios e graves em mesmas intensidades) e tempo de reverberação adequado para seu ambiente (para que não soe como uma catedral com uma banda de rock, nem como um violino que parece um gato miando em um ambiente muito morto, abafado) .

Pontos fracos do isolamento acústico por ordem de recorrência

  1. Janelas: rota de fuga mais fácil para o som. Normalmente, janelas simples costumam ter frestas que passam ar e, obviamente, o som. Está em primeiro lugar, pois liga o ambiente diretamente com a rua, onde quase sempre não temos controle algum do que acontece.
  2. Portas: depois das janelas, as portas costumam ser o pior ponto de vazamento. Uma TV ligada na sala ou seu volume alto no estúdio na hora do jantar podem se tornar um problemão. Evitar a passagem de som entre ambientes de uma mesma residência pode ser bastante importante para o convívio em harmonia.
  3. Forro e teto: se sua casa tem laje (concreto) no teto e você não é um baterista que só toca em baterias acústicas, pode passar para o próximo item. Caso não, lembre-se de que baixas frequências (os graves) costumam não obedecer a paredes ou teto, sem massa, com forro de PVC e telha de amianto. Vai vazar pelo teto!
  4. Paredes: preocupação maior de muita gente, mas nem sempre ela é o maior problema. O fato é que uma parede de alvenaria costuma ter massa suficiente para barrar quase todas as regiões de frequência. Inegavelmente, os graves em alta pressão sonora podem vazar, mas se você não tocar contrabaixo elétrico com um cubo, bateria acústica, ou ouvir seu trabalho em altos volumes, isso não será um problema para você.
  5. Piso: relaxa! No home studio, dificilmente precisamos agir no piso, mas bateristas em apartamentos talvez tenham que cogitar um piso flutuante para o seu ambiente.

Pontos fracos do condicionamento por ordem de recorrência

  1. Sala com reverb excessivo ou “eco”: normalmente, um ambiente que não tem materiais porosos em boa parte de sua superfície ou tem superfícies lisas massivas e planas (como paredes à mostra, por exemplo), torna-se muito vivo (reflexivo). Para isso, promova absorção através de espumas, lãs de vidro, lãs de rocha, lã de PET. Lãs de vidro e rocha devem estar protegidas por tecidos que não as deixem expostas ao contato com a pele. Podemos, até mesmo, promover difusão com materiais que quebrem as reflexões de pedaços e as joguem em diferentes direções. No caso das espumas, evite comprar as mais baratas para colocar em todo o ambiente. Certamente, irá suprimir as frequências de médios e agudos, e absorver as baixas frequências, os graves.
  2. Sala com graves retumbantes: um problema difícil. Primeiramente, evite o uso de monitores de referência muito grandes para seu espaço. Salas e quartos pequenos podem se tornar retumbantes com alto-falantes grandes. Portanto, procure monitores de referência do tipo near field (geralmente, pequenos), pois talvez sejam mais adequados ao ambiente. Resolvido o problema do monitor, se, mesmo assim, sobrarem graves em seu ambiente, use outros artifícios para absorver essas frequências com comprimento de onda tão extensos. Para isso, pode usar placas ressonantes, bass traps (armadilhas de graves), entre outras formas, quase nunca baratas.
  3. O resultado do trabalho fora do home studio soa muito diferente. A simetria da sala (possibilidade de ouvir direita e esquerda com mesma qualidade), a escolha do monitor de referência, a acústica do ambiente, tudo influenciará no resultado do trabalho. Um monitor de referência com agudos demais fará seu som ficar velado (abafado, sem agudos) em outro lugar, pois você atenuará o que não deveria. Problema resolvido se você entende que essa sobra deveria ser mantida na mix, lógico, se é uma característica do monitor.

Vou gravar instrumentos acústicos na minha sala?

Caso o motivo da existência de seu home studio seja fazer mixagem, masterização, produção de música eletrônica ou gravações de instrumentos conectados diretamente em sua placa, os problemas de acústica para home studio podem não ser tão grandes assim. Agora, se você pretende gravar instrumentos acústicos com microfones, terá que prestar bastante atenção ao que foi dito acima.

Se algo impede de tratar seu ambiente, como: imóvel locado, espaço físico diminuto, posição de onde está seu sistema ou orçamento, você pode até pensar em fazer seu trabalho com um bom fone de ouvido construído para essa aplicação. Adianto que a percepção muda se comparada às caixas acústicas. Todavia, pode ser uma alternativa para driblar os problemas do ambiente.

Conclusão

Em suma, não existe receita de bolo, infelizmente. Compra de kits “prontos” para tratamento acústico podem melhorar um pouco o seu problema. Entretanto, não posso deixar de frisar que, se você atacar os problemas, um a um, você gastará menos por ter sido uma compra racional. Pergunte-se: por que estou comprando esse material? Quando você conseguir responder com qualidade a si mesmo, estará preparado para adquirir o material mais apropriado para seu problema.

Só para lembrar, isopor (EPS) é um ótimo isolante térmico, não acústico. Caixa de ovo serve para colocar ovo.

Torço para que entenda nosso ponto de vista. Não falamos diretamente sobre qual material usar, porque não acreditamos que isso vai resolver o seu problema. Encare este texto como parte de todo o conhecimento que você vai precisar para fazer a coisa certa. Qual espuma? Lã? Qual corner trap? Você escolherá de acordo com o seu orçamento. Nosso objetivo aqui é outro: dar segurança do que você está comprando racionalmente.

Em contexto geral, leia também o Check List de Equipamentos para Home Studio que o Mundo da Música preparou para você para ajustar suas necessidades entre ambiente e equipamentos.


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Nerau