Alinhamento de som: o começo

Talvez um post neste blog pode ser insuficiente para falar de um assunto tão vasto e multidisciplinar como alinhamento de som. Um livro? Talvez dois!

O processo de alinhamento de sistemas quase sempre começa antes mesmo de existir um sistema para ser alinhado. Um projeto bem feito garantiria bem menos trabalho para equilibrar nossos graves médios e agudos. Ou seja, cada sistema de som, por si só, trará mudanças no que você estará ouvindo dadas as suas características. Então, acertar na compra do sistema que case com o ambiente que você precisa sonorizar é tão importante quanto qualquer processo de alinhamento que você virá a executar.

Com base nisso, o Mundo da Música vai tentar ajudar você a entender o processo de alinhamento de uma forma bem simples, e ainda evitar que caia em armadilhas e algumas “receitinhas de bolos” espalhadas por aí. Acompanhe!

Onde eu estou?

  •  Ambiente aberto: neste caso, não há paredes para refletir o som para o ouvinte, fato que melhora o som no quesito quantidade de cancelamentos, mas, às vezes, até piora o sentido de gravidade do cancelamento. Isso ocorre principalmente em sistemas de múltiplas fontes sonoras (o estéreo, para começar), pois, dessa forma, não temos as paredes para amenizar os problemas. É muito comum em eventos ao ar livre ficarmos em uma posição não central (linha em que deveria estar a house mix) e acabar não ouvindo adequadamente uma região de frequência devido ao cancelamento entre os dois lados do P.A.
  • Ambiente fechado reverberante: quatro paredes, um teto e um piso, todos refletores, podem complicar bastante a vida de um técnico. Esse caso é muito comum em igrejas, em que se pensa em acústica depois que a tinta já está na parede. Quando não temos uma acústica adequada, se torna ainda mais importante posicionar as fontes sonoras de forma a minimizar as reverberações. Isso ajudará bastante a não ter cancelamentos, bem como melhorar a inteligibilidade da palavra proferida.
  • Ambiente fechado tratado acusticamente: o Céu na terra dos técnicos de som. Quando a coisa já começa boa, é mais fácil terminar melhor ainda. Sabemo que é raro, mas esse ambiente facilita muito o processo de alinhamento de sistemas, pois garante que o alinhamento feito seja ouvido por todos no ambiente. É comum que. em ambientes não tratados acusticamente, tenhamos que escolher a quem atender em detrimento de outros.

O que preciso sonorizar?

  • Oratória: em uma palestra ou uma igreja que não tenha banda de louvor poderá ser sonorizada com caixas acústicas com respostas de frequência compatíveis ao programa executado (a voz). Isso simplifica o range em que nosso alinhamento de som será feito, já que as frequências abaixo ou acima da região vocal não seriam o objetivo maior.
  • Música com poucos instrumentos: aqui, o programa musical muda um pouco. Então, devemos verificar se o sistema responde à tessitura (nota mais grave a nota mais alta que os instrumentos atingem) dos instrumentos presentes. Caso os instrumentos atuem fora do range do sistema, será danoso obrigar as caixas a executarem essa tarefa. Um bumbo de bateria em uma caixa preparada somente para voz gerará muita distorção, afetando não somente a sonoridade do bumbo, mas o som total da caixa acústica.
  • Banda completa: neste caso, esperamos ter um sistema completo que atue de forma eficaz no range aproximado de 40 Hz a 14 KHz (aproximadamente). Esse range contemplaria praticamente todos os instrumentos comuns das bandas que sonorizamos. Então, precisamos pensar o alinhamento para este range completo.

Que equipamentos de som tenho à disposição?

É imprescindível fazer um levantamento de todos os equipamentos do local para averiguar os pontos em que podemos manipular/ajustar o sistema, principalmente levando em consideração a estrutura de ganho do sistema. Isto é, mantendo o sinal sempre em níveis corretos de intensidade com começo ao fim do sistema (geralmente o Zero dB dos sistemas analógicos ou o – 18dB dos sistemas digitais de 24 bits).

Será importante averiguar quantidade de caixas e seu posicionamento, pois mudanças futuras em busca de uma melhor cobertura sonora do ambiente, possivelmente, irá lhe impor novas medições.

Que tipo de música escolho para um bom alinhamento de som?

Não existe uma regra definida, mas podemos ter em mente algumas boas práticas:

  • Dê preferência sempre para as melhores gravações, fugindo dos MP3 de baixo Kbps.
  • Evitar gravações ao vivo com muita ambiência, isso pode misturar a reverberação local com a da música, e não conseguimos distingui-las.
  • Escolha músicas que têm elementos em todo o range de frequência, ou seja, dos graves aos agudos.
  • Evite músicas excessivamente rítmicas ou excessivamente melodiosas. Músicas percussivas nos dão boa ideia de tempos de reverberação, mas não em extensão de resposta de frequência. Já as músicas melodiosas demais causam o oposto.
  • Estude exaustivamente as músicas em sistemas de referência (preferencialmente de estúdio). Você precisa conhecer a música como se fosse seu criador e escutar todos os seus elementos no sistema que está alinhando!

O que é a tal da fase?

A fase é o tempo de chegada do som de todos os falantes do seu sistema em seu ouvido. Como o som tem uma velocidade fixa, se você está minimamente mais distante de uma caixa em relação a outra o som soará diferente por somas acústicas e cancelamentos. Não tem jeito!

Mesmo que sua caixa de som seja perfeita (o que não existe), o fato de usá-la em um ambiente reverberante ou somado simplesmente usando mais de uma caixa, mesmo que idênticas, fará com que o som chegue aos seus ouvidos em tempos diferentes. E essa soma será o seu problema.

Pode parecer que tudo está falando junto, já que nosso ouvido não está preparado para ouvir diferenças tão pequenas. Porém, acredite: essa diferença de tempo afeta muito o alinhamento de som, criando buracos na resposta de frequência. Chamamos isso de Comb Filter (filtro em formato de pente).

Guia do técnico de áudio de igreja

Que software eu uso para fazer o alinhamento de som?

O que você tiver acesso. O software é só uma ferramenta para ajudar a “ver” o som. Temos o famoso (e bem pago) Smaart Live, sonho de consumo de boa parte dos técnicos de áudio, mas também temos softwares gratuitos de origem open source (livre), como o RiTA e o REW (Room Eq Wizard).

Saber como fazer boas leituras com esses softwares e saber interpretar os seus resultados será muito mais definitivo em seu alinhamento do que propriamente a diferença entre eles. Então, o mais importante é dominar a interpretação dos resultados das medições, bem como validar se realmente foi uma medição correta. Depois disso, as correções do sistema se tornam muito mais simples.

Quais seriam os equipamentos mínimos para um alinhamento de sistemas?

  • Um computador. Nem precisa ser tipo gamer, pode ser um simples com boa memória RAM e um sistema operacional enxuto. Devemos evitar lotar nossa área de trabalho com programinhas. Esse excesso pode trazer alguma instabilidade e complicar a nossa medição, trancando nosso sensível software de medições.
  • Uma Interface de Áudio dedicada. Não precisa de muito, também. Um canal para entrada de microfone (com Phantom Power) e uma entrada de linha para algumas aplicações presentes nos nossos softwares (como a função transferência do Smaart Live), já fazem bem o serviço. Lógico, quanto melhor a pré amplificação do microfone e a conversão de sinal analógico para digital, melhor… quem diria?
  • Um microfone de medição. É imprescindível que tenhamos um microfone omnidirecional (que capta som de todas as direções) e que tenha a resposta plana (“ouça” de 20 Hz a 20 KHz com pouquíssima variação). Este é um microfone praticamente “sem coloração”, ou seja, ele não impõe característica ao que é ouvido.

Posso alinhar meu sistema com um smartphone?

NÃO! Mas, espera aí! Conte mais sobre o que pretende fazer.

Um smartphone não foi construído para isso, pois seu microfone foi desenhado e configurado para ouvir a sua voz. Ele costuma não ter resposta de frequência completa e as intensidades de sinal passam por processamento como compressão e até equalizações para otimizar a sua fala. Isso torna-o incapaz de gerar um alinhamento confiável.

Mas se você pretende usar ele somente com uma ferramenta alternativa aos outros métodos de alinhamento que você usa, a compra de um microfone de medição e um equipamento que pule o processo de captação e processamento do microfone do telefone, até pode ser aceitável. Temos hoje no mercado dispositivos que alimentam os microfones com phantom power e pré amplificam esse sinal largando o áudio em sinal de linha mais plano possível pela entrada TRS (P2) do seu aparelho .

Agora só nos resta a escolha de um aplicativo adequado para a leitura, gratuito ou não. Isso não substitui os softwares conhecidos e dedicados a essas leituras. Porém, pode ser uma ferramenta útil para quem não quer gastar muito e não pretende fazer grandes alinhamentos de sistemas.

Conclusão

Para um bom alinhamento de sistemas, é necessário bastante estudo – nem sempre para fazer os ajustes, mas para entender o universo de possibilidades que está à sua volta. Às vezes, uma simples reflexão no piso (afinal, não temos como tirá-lo) pode alterar nossa medição e, principalmente, a nossa percepção dos problemas contidos nessa árdua tarefa.

Como dito lá em cima, estamos falando de um assunto multidisciplinar. Portanto, quanto mais você estudar física, acústica, sistemas de som, processadores, caixas de som, psicoacústica e tudo o que envolve o que emite som e o que ouvimos, mais preparado você estará para ajustar o seu som.

Inspira, expira e bons estudos.


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Nerau